quinta-feira, 23 de maio de 2013

O direito à moradia e a moradia com direitos – Parte 1

A cidade como centro de ambições

Originalmente postado por Vinícius Oliveira* no site do Movimento Terra Livre

Se o sistema capitalista arrasta e traz para si qualquer fator de lucro, a  terra e a territorialidade não escapam desse poder arrasador. As cidades que eram as moradas dos trabalhadores para  a exploração no local de trabalho de suas forças converte-se em mais um fenômeno na exploração. A organização espacial, o meio ambiente, acesso à bens públicos (seja escola, creches, posto de saúde), proximidade do centro ou de paisagens urbanas simbólicas para o sistema (como Shoppings) ou ambientais (como praias, rios etc)  viram valoração monetária e  mais motivos de exclusão social e remoções.

Segundo dados de João Sette Ferreira, metade da população brasileira mora em lugares informais (sem os documentos regulamentados) e 20% do total moram em favelas. Lembrando que a primeira vez que a palavra “favela” foi utilizada era como modo claro de criminalização de uma luta popular histórica: Canudos.

A URBANIZAÇÃO alicerçada de investimento público nos bairros ou regiões, quando apropriadas pelas grandes construtoras ou especuladores que mantém grandes bancos de terra ou grandes empreendimentos seja de moradia e comércio geram a “mais valia urbana”. Isso significa dizer que o ESTADO é agente direto da lógica de exclusão social e de uma cidade excludente, quando os bairros mais ricos contém bens públicos de qualidade, como asfalto, segurança pública, transporte público, limpeza, educação, saúde os valores dos imóveis crescem em seu valor de troca (categoria marxista) gerando mais lucros para as construtoras e empresas da área.

É o nascimento e fortalecimento da especulação imobiliária. Porque as construtoras geralmente mantêm um banco de terras sem utilização alguma, aguardando o acordo com o Estado, geralmente em processos eleitorais, visando o investimento público nessas localidades com a combinação desse movimento, grandes prédios e conjuntos residenciais começam a ser levantados e os preços se elevam absurdamente. Nesse esquema, os bancos entram com empréstimos a juros altíssimos e com prestações a perder de vista, que quando o trabalhador não consegue pagar (pela queda cada vez maior do salário real), o apartamento volta para o banco, que mantém vazio até vender por um preço muito maior do que vendido pela própria construtora.

A dita “classe média” sem perceber esse movimento entra nessa ação e se empolga com o Minha Casa, Minha Vida, programa habitacional para famílias que recebem de 3 a 10 salários mínimos do Governo federal que gera um abatimento do valor do imóvel. É a jogada perfeita do Estado capitalista, o cidadão não compreendendo como funciona a política habitacional permite ao Estado que ele transfira dinheiro diretamente para as grandes empresas, em um valor de até 18 mil reais, dinheiro suficiente para a construção de uma casa, se tirássemos a mais valia das empresas, bancos e Estado envolvido neste processo. É a transferência de renda perfeita do Estado para as grandes empresas fortalecendo a cidade empresa.

Na periferia, que tradicionalmente foram ocupações anteriores o Poder público não realiza a regulamentação fundiária. Ou seja, ele não permite a certificação do direito de posse da moradia ou terreno que os trabalhadores residem por vários anos. Isso permite que no futuro, com essa margem de manobra, se for necessário os trabalhadores possam ser removidos ou despejados, como o caso de Pinheirinhos em São Paulo ou de moradores do Bugio em Aracaju. Os argumentos para remoção sempre se travestem de interesse público, seja por questão ambiental ou para construção de grandes obras, como as obras da Copa e Olimpiadas.

A bandeira da Regulamentação Fundiária dentro dos bairros populares e de periferia é importante para sinalizar e disputar a organização territorial para o povo. O contrário desse movimento já acontece com o processo fundiários as avessas, onde os bancos,empreiteiras,construtoras,empresas e especuladores mapeam todo o território que estiver em condição informal compram terras das mãos do poder público ou negociam por grilagem sem a população sequer saber. As associações de moradores e movimentos populares tem que se atentar, que existe inclusive argumentos legais previsto pelo Estatuto da Cidade (2002) que regulamenta a questão no artigo 2 e no Plano Diretor do Municipio.

Art. 2o A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes gerais:

XIV – regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanização, uso e ocupação do solo e edificação, consideradas a situação socioeconômica da população e as normas ambientais;

A cidade vira um dos centros das ambições, parafraseando Chico Science transforma-se  no bojo na superexploração da condição de vida do trabalhador. A mais valia retirada no local de trabalho, é retirada no vampirismo do capital na (des)organização do território. Não existe disputa com a organização de locais de trabalho, são apenas movimentos da dialética do capital financeiro urbano. É como a turma do asfalto gera as favelas.

E para nós, filhos do mangue, lutemos peça reciclagem ecológica da vida, a resistência cotidiana é fato no plano individual, mas precisa encontrar eco na coletividade, na organização popular, sem cercas e sem muros. Na luta pela liberdade e igualdade entre homens e mulheres é imprescindível uma terra livre.

* Vinícius Oliveira é militante do  movimento popular Terra Livre e do PSOL.

PS: O segundo artigo será sobre a falta de moradia e os movimentos populares.



sexta-feira, 10 de maio de 2013

360 famílias em luta por moradia em SE

A ocupação de moradores novo amanhecer é resultado de uma ação de despejo, proveniente de decisão judicial. No dia 21 de março de 2013 o despejo ocorreu sem respeito aos direitos dos ocupantes de casas construídas com verba do governo federal. A prefeitura de Aracaju, em outubro de 2012, era dirigida pelo PCdoB. O prefeito Edvaldo Nogueira estabeleceu o critério de sorteio para entregar unidades as habitacionais construídas.

Diante da situação de abandono que se encontravam as casas no 17 de março, bairro situado na zona sul da cidade, também conhecida como zona de expansão, cerca de 800 famílias desprovidas de casa própria resolveram ocupar estas residências. Seis meses depois, essas famílias foram despejadas, sob o pretexto de que tais unidades seriam distribuídas a população mediante sorteio realizado pela Prefeitura. Tal sorteio foi realizado com inúmeras irregularidades, que vão desde a forma de de divulgação até o fato de o sorteio ter sido realizado no dia 31 de dezembro, dentre convidados pre-selecionados pela prefeitura.

Após o despejo, os moradores começaram a ocupar uma praça nas proximidades das casas. Um movimento inicialmente acompanhado por uma liderança vinculada ao mandato do Deputado Estadual João Daniel (PT/SE), se caracterizou pela ausência de fóruns democráticos, falta de transparência quanto as informações e constituição de uma única líder vinculada a este mandato que não estava na ocupação e portanto não acompanhava cotidianamente a vida das famílias que se aglomeravam a cada dia movidas pelo sonho da casa própria.

Diante de tais contradições, cansados da falta de informações e do método antidemocrático uma comissão de moradores procurou militantes do PSol - Partido Socialismo e Liberdade - para acompanhar a ocupação. Os militantes desta organização passaram a acompanhar cotidianamente a ocupação, propondo assembleias noturnas, assessoria jurídica, comissões de organização e de apoio, com intuito de garantir a autonomia dos moradores em sua luta, o que resultou na organização de creches, cozinha coletiva, oficinas culturais dentre outras ações relacionadas a resistência diária de um povo que a cada dia aprende que ter moradia não deve ser um privilégio mas um direito que deve ser conquistado, mesmo que em lei ele já esteja  garantido.

Na data desta postagem estamos a mais de um mês de ocupação. Enfrentamos a cada dia novos desafios. Aprendemos em um clima de ameaças que a degeneração do PT e do MST ganha contornos criminosos no Estado, que se valem dos benefícios concedidos pelos programas Federais para subverter princípios históricos da luta popular.

Em que pese todas essas dificuldades, a ocupação realizou dois grandes atos públicos em defesa da moradia, e arrancou a atenção da imprensa, da Câmara de Vereadores e conquistou uma visita de 8 parlamentares num cenário de constantes denúncias públicas do descaso do poder público ao sofrimento desta população. Com o período de chuvas a situação da ocupação passou a enfrentar grandes obstáculos, marcados pelo sofrimento de crianças, muitas delas recém nascidas que padecem da profunda privação de direitos humanos básicos e fundamentais como a saúde, a moradia, a alimentação e a educação. Enfim... uma realidade marcada pela ausência de dignidade humana.

Resta-nos a certeza da continuidade na luta e a esperança de que esta triste realidade desperte a solidariedade e a força social necessária à vitória do movimento. Participe deste movimento! Faça contato conosco pelo e-mail ocupa17demarco@gmail.com e envie moções de apoio ao movimento ou de repúdio à indiferença estatal cometida pelo Prefeito João Alves Filho (DEM/SE).