quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Povo de Aracaju e Carmópolis juntos contra a opressão do Estado, do capital e do peleguismo


O nome disso é solidariedade na luta: Novo Amanhecer e Conjunto N. Sra. do Carmo


Na quinta, dia 20, como muitos puderam acompanhar de forma distorcida na mídia hegemônica ou de forma mais transparente nos meios alternativos, o Estado burguês deixou cair mais uma vez sua máscara de bonzinho e mostrou toda a sua força de opressão pra cima do povo. Na Ocupação do Conjunto Nossa Senhora do Carmo, em Carmópolis, onde cerca de 400 famílias lutam por moradia, o dia 20 de novembro - dia da Consciência Negra - foi celebrado com mais uma ofensiva contra os direitos e dignidade da população negra e pobre de Sergipe.

A polícia humilhou batendo e prendendo. A grande mídia fez, de modo figurado, a mesma coisa, ao legitimar a opressão com uma absurda distorção dos fatos. Disseram que foi a resistência quem começou agredindo a polícia com pedras e a resposta foi a entrada da Choque. E ainda usaram um argumento ridículo de que 'haviam pessoas de Aracaju, que não tinham relação nenhuma com as famílias dessa invasão'.

Quer dizer que a polícia, o Estado, a mídia agora quer dizer o que temos ou não em comum? Que não podemos compartilhar do mesmo sofrimento e da mesma resistência pra superar isso? Pois saibam: a Ocupação Novo Amanhecer esteve sim presente na resistência das famílias de Carmópolis porque essa luta é de todos os que sofrem dia após dia com a opressão.

O que temos em comum, mais que parentesco ou morar no mesmo lugar, é o sofrimento, o descaso, a indignação e a resistência que nos torna irmãos e irmãs! Somos todos iguais e estaremos sempre presentes nas lutas um do outros e isso não para por aí: vamos fazer crescer cada vez mais esse sentimento de solidariedade e ajuda mútua entre os que sofrem e assim conseguiremos fazer com que as "derrotas" como a de ontem em Carmópolis sejam cada vez mais raras até que a opressão seja, definitivamente, derrotada.

Saímos mais fortes, ao contrário do que a mídia, a polícia e o Estado fazem parecer. Voltamos mais convictos que estamos fazendo a coisa certa, embora não houvesse um pingo de dúvida em nossos corações. Hoje voltamos pra Aracaju para cobrar do prefeito João Alves uma posição definitiva em relação ao nosso auxílio-moradia. Já são mais de oito meses vivendo em barracos. Vamos pra cima!


Leia nota do Movimento Terra Livre Sergipe sobre o ocorrido ontem:

Cada injustiça cometida contra o povo nos enche de energia para continuar na luta

Um pouco da luta da Ocupação no Conjunto Nossa Senhora do Carmo, em Carmópolis

O dia 20 de novembro de 2013 poderia ficar marcado como um dia triste para os movimentos sociais em Sergipe. No dia da Consciência Negra, um dia afirmativo de luta e resistência contra a opressão, a marca que ficou em nossas mentes, corações e corpos foi o das balas de borracha e a pele avermelhada irritada pelo gás lacrimogêneo. Esse é mais um caso da dura repressão promovida pelo Estado contra a população negra e pobre, num dia em que cerca de 400 famílias enfrentaram toda a truculência de uma Polícia Militar a mando da Prefeitura de Carmópolis, do Poder Judiciário e sem preparo humanístico para lidar com a população.


É importante contextualizar a luta: havia uma organização do MOTU que deixou a maioria das famílias muito insatisfeita com a condução dos encaminhamentos. Após uma negociação com participação da Comissão de Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de Sergipe, havia uma demanda judicial determinando que a Prefeitura de Carmópolis cadastrasse e realizasse um estudo socioeconômico para atestar quais famílias teriam direito à moradia.

Entretanto, o MOTU aceitou um acordo proposto pelo Poder Judiciário a serviço da Prefeitura para a concessão de 100 casas, com critérios próprios e nada objetivos para definir quais famílias teriam direito ao benefício. Diante disso, cerca de 300 famílias que ficariam de fora dessa escolha que seria capitalizada com fins políticos, e não sociais, procuraram o Movimento Terra Livre para reorganizar a luta. 

Há uma clara diferença nítida entre a atuação dos dois movimentos. De um lado, o MOTU aceitou um acordo sabendo que haveria uma reintegração de posse que deixaria as famílias desamparadas, na rua e sem lugar para ficar. Mesmo assim, buscou desmobilizar o povo da ocupação para que a reintegração corresse sem transtornos para o cronograma da Prefeitura, que já preparava uma festa de inauguração do Conjunto N. Sra. do Carmo para o mesmo dia. Esse não é o papel de um movimento social, mas de uma assessoria que atua a serviço de um governo com orientação contrária aos interesses do povo.

O resultado foi a expulsão do MOTU por parte da comunidade, processo que teve a intermediação do Terra Livre relativamente limitada à proteção da integridade física dos integrantes do movimento rechaçado. Esses, por sua vez, ao tempo todo buscaram acusar de oportunismo a atuação do Terra Livre, a despeito do fato de que foi a maioria da comunidade não contemplada por esse acordo desleal que teve a iniciativa de buscar uma nova forma de organizar a comunidade para atender à necessidade de todas as famílias.

Do outro lado, atendendo ao chamado da comunidade insatisfeita com esses acordos que deixaram de fora três quartos das famílias, o Movimento Terra Livre buscou a reorganização e empoderamento da comunidade em torno de sua autonomia, soberania, conscientização e luta efetiva por direitos. Para isso, contribuiu no processo de construção da Resistência à reintegração de posse em torno das barricadas, no modelo aplicado na Ocupação Novo Amanhecer, em Aracaju. Essa resistência, que visava atrasar a ação da polícia enquanto se buscava instrumentos jurídicos para reverter a decisão judicial, foi reprimida em Carmopólis com força desproporcional.

Diversas irregularidades podem ser apontadas na ação de hoje pela manhã por parte da Polícia Militar do Estado de Sergipe e do Poder Judiciário, que ordenou a ação a pedido da Prefeitura de Carmopólis: prisões arbitrárias e aleatórias, agressões contra a população, inclusive adolescentes, uso indiscriminado de gás lacrimogêneo e balas de borracha, inclusive apontando o disparo dessa arma pouco letal na altura da cabeça, armas letais apontadas a queima roupa no rosto de pais e mães de família, ameaças... atos dignos de um Estado de exceção. Há inclusive casos de gestantes atingidas por projéteis de borracha, uma delas tendo que ser levada ao hospital com risco de perder o bebê. Diversas pessoas passaram mal. Uma jornalista da imprensa sergipana disse que a última vez que havia testemunhado algo semelhante foi durante a ditadura militar.

Estavam presentes durante toda a manhã representantes da Comissão de Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de Sergipe, Alfredo Nikolau e Miguel Cerqueira, que atestam os abusos cometidos durante a ação. “Há o direito à propriedade, o que se procurou garantir aqui nessa ação de hoje. Entretanto, uma Lei Constitucional é superior, logicamente, à uma lei do Direito Civil e as Resoluções Internacionais da ONU sobre ações de desocupação de áreas como essa tem peso de Lei Constitucional. Portanto, pode-se dizer que faltou conhecimento jurídico aos juízes que autorizaram essa ação: são analfabetos jurídicos”, disse Miguel Cerqueira.

O resultado foi a grande covardia cometida na manhã de 20 de novembro – dia da Consciência Negra. Essa nota começa dizendo que esse poderia ser um dia triste. Poderia, mas não será. O sentimento que nos toma e nos une é o de indignação. Perdemos uma batalha, mas a luta por moradia continua e a comunidade irá mostrar para o mundo os abusos cometidos pela Prefeitura de Carmópolis, pelo Poder Judiciário e pela Polícia Militar do Estado de Sergipe. Só uma palavra gerada a partir dessa indignação e ela se chama insurgência. Anotem: a insurgência virá e a injustiça não avançará.

Terra Livre Sergipe